Bem vindo!!!

pegue o seu no Templatesdalua.com Sejam bem vindos ao meu blog...

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Divirta-se com Clarice Lispector


Festança na floresta
Estamos no mês de junho, as fogueiras de São João se acendem, balões sobem, já há friozinho e aconchego. Dá para comer batata-doce à meia-noite com café tinindo de quente.
Mas me disseram que a festa não é só nossa. Pois não é que ia haver uma festa da bicharada na selva? E calculei que isso acontecesse no mês de nossos próprios folguedos. Pelo menos é o que garantem os índios da tribo Tembé.
Foi assim: os animais das matas até que estavam ocupados e calmos em relação a seus deveres, pois o dever do animal é existir. Mas eis senão quando surgiu no ar um boato que logo se espalhou alvissareiro num diz-que-diz assanhado. Vinha esse boato trazido pelo canto do sabiá. Como o sabiá, a quanto se sabe, canta pelo mero prazer de cantar, ficaram os bichos em dúvida sobre se era ou não verdade.
E – de repente – começou a chover convite para a tal festança. Quem convidava não dizia quem era, mas todos desconfiaram que a idéia vinha da rainha das selvas brasileiras, a onça, mandachuva que era. Todos os bichos foram convidados, garantindo-se que na ocasião seria abolida a ferocidade. Até a mãe-coruja, que de tão séria e sábia até óculos usava, foi convidada com seus filhotes.
Quanto às filhas do macaco, doidas para namorar e enfim casar, enfeitaram-se tanto e com tantas bugigangas que pareciam umas – é isso mesmo, pareciam umas verdadeiras macacas.
E quem pensa que a cobra faltou por ser tão nojenta está enganado: apareceu fazendo salamaleques com o corpo escorregadio para chamar a atenção.
A noite estava toda iluminada por milhares de vaga-lumes, pela lua silenciosa e pelas estrelas úmidas. Quanto à orquestra, fiquem certos de que era da melhor qualidade: uma turma de tucanos encarregou-se de tocar em valsa os mais belos grunhidos da mata.
A bicharada estava acesa de alegria. O papagaio foi muito aplaudido quando berrou uma canção alegre, e as macacas casadoiras, penduradas pelos rabos nas árvores, estavam certas de que eram grandes bailarinas.
Bem, a coisa estava no máximo de animação. Mas a onça estava inquieta, doida para atacar. E como não fosse permitida nessa noite a carnificina, ela começou a ser feroz com a língua viperina. Então cantou: “Dona Anita é gorda roliça que nem uma porca e tem cor de rato”. A anta danou-se e retirou-se.
A onça, vendo que tinha tido sucesso, cantou uma ofensa horrível contra o jabuti, dizendo que este estava coberto de mosca varejeira. Tanto que o jabuti, ofendido, foi embora. Depois a onça falou: “Vejam que decote indecente o das filhas do macaco”. As macacas ficaram fulas da vida e só não saíram de lá porque a esperança de arranjar noivo é a última que acaba.
Mas acontece que havia entre os animais o deus dos veados. Arapuá-Tupana, que resolveu acabar com a empáfia da onça e para vencê-la pôs-se a cantar. Os bichos, sabendo que quando o ouvissem morreriam, taparam os ouvidos. Arapuá-Tupana afinal foi embora e a bicharada não morreu.
É. Mas os animais haviam perdido o dom da fala, ninguém se compreendia mais. E isso até o dia de hoje. Porque grunhir ou cantar não diz nada. Tudo por causa da onça linguaruda.


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Registre aqui seu recadinho/comentário.